28 março 2024

Tratado de Petrópolis: conheça mais sobre a luta do Acre para ser brasileiro

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Foi em 1903 que o então ministro das relações exteriores, José Maria da Silva Paranhos Júnior, mais conhecido como barão de Rio Branco e o governo boliviano assinaram o Tratado de Petrópolis, que colocou fim à Revolução Acreana e tornou oficial a anexação do Acre ao Brasil. Nesta terça-feira (17), é dia de relembrar e comemorar os 117 anos dessa história.

Com a assinatura do documento, em 17 de novembro de 1903, o Acre deixou de ser território boliviano e, então, com 191 quilômetros quadrados de terras produtivas, passou a ser brasileiro.

O Tratado de Petrópolis é tido como a “certidão de nascimento” do Acre. O feriado que ocorreria nesta terça foi transferido para a próxima sexta-feira (20). O G1 lista algumas curiosidades que já foram destaque em nossas reportagens:

Trocado por cavalo?

Para conseguir convencer a Bolívia a vender o estado, o barão negociou áreas alagadas do Mato Grosso e ofereceu ainda a quantia de 2 milhões de libras esterlinas.

Mas, espera aí. Onde entra o tal cavalo branco que teria sido trocado pelas terras que hoje são acreanas? Então, como diz o ditado, senta que lá vem história, até porque as demarcações das fronteiras entre Brasil, Bolívia e Peru foram modificando após um emaranhado de tratados.

Tratado de Madrid

Assinado em 1750, o Tratado de Madrid foi firmado na capital espanhola entre os reis João V de Portugal e Fernando VI de Espanha, para definir os limites entre as respectivas colônias sul-americanas.

“Esse tratado definiu uma linha imaginária do Rio Javari, onde se achava que o rio nascia e a metade do curso entre a boca do Rio Madeira, lá no Solimões e Rio Beni, porque não tinha outra maneira de marcar”, explicou o historiador Marcos Vinicius Neves.

Em 1867, o Brasil ainda vivia uma monarquia, porém, a Bolívia já havia se tornado independente e, então, decidiu regularizar a fronteira, que ainda era bastante indefinida, e aí é que entra a história do cavalo branco, que tem um fundo de verdade, segundo o historiador.

O Brasil vivia a guerra do Paraguai, quando coube a Mariano Melgarejo, presidente da Bolívia, conhecido como El Loco Melgarejo, negociar as questões fronteiriças com o cônsul brasileiro Regino Correa.

“A história tem um fundo de verdade, mas, o resultado é mentira. El loco era um ditador sanguinário e era apaixonado por cavalos de raça. O cônsul brasileiro, muito esperto que era, aproveitou esse ponto fraco e, para adquirir a maior vantagem possível pro Brasil, condecorou o presidente da Bolívia com duas medalhas brasileiras e presenteou Mariano com um cavalo de raça puro sangue inglês. A coisa mais linda do mundo”, conta Neves.

Envaidecido com o presente, o presidente boliviano propõe que os dois países não briguem ainda por terras desconhecidas e, sendo assim, apontando no mapa, doou “dois dedos de terra” para o governo brasileiro.

Tratado de Ayacucho

Assim, assinam o Tratado de Ayacucho, quando foram recuadas as fronteiras bolivianas a favor do Império Brasileiro, a partir dos Rios Guaporé e Mamoré, passando por Beni e seguindo uma linha reta que recebeu o nome de Cunha Gomes. As embarcações bolivianas teriam acesso aos rios brasileiros a partir dali.

Porém, essas terras ao norte da linha oblíqua Cunha Gomes nunca fizeram parte do território acreano. Mas, desde o Tratado de Ayacucho (1867), essas terras passaram a fazer parte do estado do Amazonas.

Então, quando começa a ocupação boliviana do Acre, em 1899, o estado já estava povoado por brasileiros desde 1880 e eles não concordavam com as imposições feitas pelo governo boliviano, que cobrava impostos sobre a borracha e até aplicavam punições com chicotadas.

Uma nova interpretação do tratado de Ayacucho chegou a ser feita, o que aumentaria as terras para o Brasil. Esse releitura ficou conhecida como nova inteligência do Tratado de Ayacucho, mas não foi aceita pelo governo boliviano, e é aí que começa a Revolução Acreana.

Luta por território

O governo brasileiro se nega a apoiar as reivindicações dos brasileiros, mas, mesmo assim, a batalha se estendeu por quatro anos – de 1899 a 1903.

“Quando o novo presidente do Brasil, Rodrigues Alves, assume, ele convida José Maria da Silva Paranhos Júnior, mais conhecido como barão de Rio Branco, para ser ministro das relações exteriores no Brasil”, contou Neves.

A disputa, então, tem uma trégua e é assinado o Tratado de Petrópolis. A partir daí, o conflito com os bolivianos cessa, mas o Brasil também precisava entrar em acordo com os peruanos.

“Então, começa uma nova rodada de negociações entre o barão de Rio Branco e o governo do Peru para regularizar a questão do Juruá. Até que, em 1909, o Brasil e o Peru assinam também o Tratado do Rio de Janeiro e resolvem o problema de litígio sobre o Acre”, complementou o historiador.

Fronteira cultural

Para o historiador Marcus Vinícius, ao se desligar da Bolívia por meio de uma guerra, o estado acreano acabou tendo pouca influência cultural do país vizinho.

“Do ponto de vista do comportamento étnico cultural, essa passagem é mais difícil, porque a gente se tornou vizinhos a partir de um movimento de guerra. Então, o que estabeleceu uma divisão ideológica, nacional e política, de uma certa maneira, freia essa troca cultural, na medida em que ela não é amistosa e sim a partir de conflitos”, contou Neves.

Entre as poucas influências culturais, o historiador lembra de uma receita típica da Bolívia que é queridinha dos acreanos: a saltenha. E o Santo Daime, religião criada no estado acreano, mas que surgiu por influências indígenas bolivianas e peruanas, de onde sai o Ayahuasca.

Um dos principais eventos de filmes na Amazônia e América Latina, o Festival Pachamama, que ocorre em Rio Branco, leva o nome de uma deusa dos povos indígenas dos Andes centrais.

Além da diferença na língua, outro fator que pode ter resultado na pouca influência cultural é o fato do país vizinho carregar a cultura andina e ter muitas etnias indígenas.
Por G1 AC

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