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CGU vê irregularidades em mais de 25 mil concessões de BPC e cobra providências do INSS

Auditoria realizada pela Controladoria-Geral da União (CGU), à qual o Metrópoles teve acesso, identificou falhas no pente-fino realizado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sobre Benefícios de Prestação Continuada (BPC) e pediu que a autarquia federal tome providências para melhorar a apuração de irregularidades no pagamento do auxílio assistencial.

No total, o órgão controlador identificou que mais de 25 mil beneficiários não constavam no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) como situação “regular”. A CGU apontou os riscos relacionados à falta de definição desses casos.

Para elaborar o relatório, a Controladoria-Geral da União analisou uma série de situações que podem ocasionar a suspensão ou a cessação do benefício.

A legislação estabelece que a inscrição no CPF é requisito para a concessão e a revisão do BPC. Além disso, estipula que o benefício será suspenso em caso de “inconsistências ou insuficiências cadastrais que afetem a avaliação da elegibilidade do beneficiário”.

O órgão apurou que o monitoramento dessa situação vem sendo feito a partir do Sistema de Verificação de Conformidade da Folha de Pagamento de Benefícios (SVCBEN) e do Painel de Qualidade de Dados do Pagamento de Benefícios (QDBEN).

“Apesar disso, constatou-se que não existe monitoramento sobre CPF em situação diferente de ‘Regular’, haja vista as normas não serem explícitas sobre tal exigência para a concessão e a manutenção do BPC”, assinalou a CGU, na auditoria.

“Por fim, a partir das informações apresentadas pelo INSS, constata-se que apesar de grande parte dos achados da CGU terem sido detectados pelo SCVBEN e constarem da fila de análise do QDBEN, os benefícios permaneciam sem análise conclusiva até fevereiro de 2021, demonstrando dificuldade da autarquia em dar tratamento tempestivo aos casos detectados, especialmente considerando a existência de diversas outras demandas geradas pelo sistema, além das relacionados com o BPC”, prossegue.

A Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS), do Ministério da Cidadania, respondeu à CGU que, desse total, 7 mil já estavam fora da folha de pagamentos e outros 2,6 mil se encontravam devidamente regularizados.

Hoje, a fila do INSS tem mais de 1,902 milhão de requerimentos em análise. Desses, 1,460 milhão aguardam decisões do próprio órgão e 442 mil, alguma movimentação do segurado. O volume é superior se comparado a março do ano passado, quando 1,802 milhão de pedidos estavam sendo analisados, o que indica que a autarquia não conseguiu solucionar o problema durante a pandemia de Covid.

O BPC é concedido no valor de um salário mínimo (hoje em R$ 1,1 mil) mensal à pessoa com deficiência ou ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção. É preciso ter renda familiar de até um quarto do piso nacional por pessoa.

De acordo com dados do último Boletim Estatístico da Previdência Social, publicado em maio deste ano, cerca de 4,7 milhões de brasileiros recebem o BPC atualmente, em um montante total de R$ 5,2 bilhões.

O INSS antecipou ao Metrópoles que elabora um cronograma para se adequar às recomendações da controladoria.

O relatório, finalizado em abril deste ano, mostra que até existem controles para identificação de erros, mas o INSS tem apresentado dificuldades para encontrar todas as potenciais inconformidades e concluir a apuração de forma rápida.

“Restou confirmada a existência de normativos internos e de procedimentos, instituídos pelo INSS, orientando a realização de atividades para tratamento de possíveis irregularidades ocorridas. No entanto, […] verifica-se que o INSS apresenta dificuldade em dar tratamento tempestivo aos benefícios com indicativo de irregularidade, sejam esses identificados pelos órgãos de controle ou pelos próprios gestores”, assinala a CGU.

Sem reavaliações bianuais

O órgão controlador também aponta para a não realização das reavaliações bianuais da deficiência e do grau de impedimento dos beneficiários do BPC, o que, segundo o instituto, deve-se ao elevado volume de demandas.

A legislação define que o Benefício de Prestação Continuada deverá ser revisto a cada dois anos, para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. Trata-se de uma revisão diferente da apurada nas ocasiões anteriores, que são “administrativas”.

Relatório de 2018 da controladoria apontou que essa revisão bianual não era realizada desde 2008.

“Como possíveis consequências da situação relatada, verifica-se a ausência de previsibilidade sobre o eventual início das reavaliações bianuais da deficiência e do grau de impedimento dos beneficiários do BPC, prejudicando o planejamento dos envolvidos no processo, bem como o risco de manutenção do BPC a pessoas que deixaram de se enquadrar nos critérios de elegibilidade ao benefício”, pontua.

Em fevereiro deste ano, o Ministério da Cidadania e o INSS publicaram uma portaria conjunta que estabeleceu um grupo de trabalho (GT) com o objetivo de viabilizar a revisão do BPC. O GT tinha duração de 90 dias.

A mesma falta de tempestividade é observada pela CGU em casos de beneficiários que têm renda familiar per capita superior a 1/4 do salário mínimo ou que acumulam o BPC com atividade remunerada.

O relatório aponta falhas, ainda, na identificação, pelo INSS e pelo Ministério da Cidadania, de recebimento de outros benefícios no âmbito da Seguridade Social ou de algum outro regime.

A Lei nº 8.742/1993 e o Decreto nº 6.214/2007 dispõem que o BPC não pode ser acumulado com outro benefício. O SNAS sabe disso e tem feito a revisão periodicamente, mas, mesmo assim, foram identificados pela CGU 9.987 BPCs, na folha de pagamentos de maio de 2020, com indicativo de que o beneficiário recebia, cumulativamente, benefícios do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).

“Como uma das causas para tais ocorrências, tem-se a indisponibilidade das bases de dados com informações sobre os RPPS ao Ministério da Cidadania ou ao INSS – exceção feita às informações presentes no Sistema Integrado de administração de Pessoal (SIAPE) – o que inviabilizaria a realização das verificações relacionadas pelos gestores”, relata a CGU.

Outro lado

A pasta e a autarquia foram procuradas para detalharem o resultado do grupo de trabalho e se posicionarem frente ao relatório da CGU.

Em nota, o INSS informou que recebeu o relatório e que elabora um cronograma para se adequar às recomendações da CGU. “É válido destacar que o INSS considera de extrema importância o acompanhamento e sugestões dos órgãos de controle”, assinalou.

Sobre os resultados do grupo de trabalho, o instituto recomendou procurar o Ministério da Cidadania. A pasta, porém, não relatou resultados. Veja a íntegra da nota enviada pelo órgão, hoje comandado pelo ministro João Roma:

“Sobre o grupo de trabalho criado a partir da Portaria Conjunta SEDS/MC, SEPRT/ME, INSS, SNDPD/MMFDH Nº 94, de 24 de dezembro de 2020, o Ministério da Cidadania esclarece que foi realizado um estudo técnico para viabilizar a revisão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e produzir subsídios que vão aprimorar o procedimento revisional do BPC. Foram abordadas questões para o desenvolvimento da revisão do benefício, como concepção do procedimento, estruturação e operacionalização do processo”.