Uma semana após o forro do Hospital João Câncio Fernandes, em Sena Madureira, interior do Acre, desabar em cima dos pacientes, a dona de casa Luiza Gadelha Lopes, de 51 anos, mãe de Izailton Gadelha da Silva, de 33 anos, só consegue sentir tristeza e revolta. O filho dela foi atingido pela estrutura e morreu no Pronto Socorro de Rio Branco no último sábado (3).
“Meu filho estava se tratando no hospital e saiu daquele jeito. Meu filho era maravilhoso, era diferenciado, não tem como recuperar a lembrança que tenho dele. Meu filho não volta mais, quero justiça”, diz a mãe.
Izailton era tetraplégico há quatro anos e estava na unidade de saúde tratando uma infecção urinária. No dia do acidente, ele era acompanhado por um dos irmãos, de 20 anos, e um amigo, contratado pelos familiares para ajudar nos cuidados dele, e já conseguia mexer as mãos.
O forro do hospital desabou na tarde da última sexta-feira (2) em cima de vários pacientes. Por precaução, o Corpo de Bombeiros interditou toda enfermaria e os pacientes foram remanejados para uma ala improvisada que antes funcionava o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).
Já na tarde de sábado(3), a Secretaria de Saúde do Acre (Sesacre) divulgou que Izailton teve uma parada cardiorrespiratória enquanto recebia tratamento no Centro de Terapia Intensiva (CTI) do PS e morreu.
Luiza estava do lado de fora da CTI à espera dos médicos quando o filho morreu. “Me mandaram acompanhar ele na CTI e quando fui entrando pediram para ficar fora que iam organizar lá. Só que mãe sente alguma coisa, eu senti algo, pedi para dar um beijo nele e deixaram. Quando sai já vieram com a notícia”, relembrou.
Ao saber da morte do filho mais velho, Luiza passou mal, teve uma parada cardíaca e precisou ser reanimada. “Tive uma parada cardíaca porque tenho problema no coração. A doutora que tentou reanimar ele, me reanimou também. Fiquei mal, não tem como recuperar meu filho”, contou.
Desabamento
Izailton da Silva ficou tetraplégico em 2017 quando caiu de uma árvore e fraturou duas vértebras do pescoço. Ele recebia os cuidados da família em casa, mas sofria constantemente com infecção urinária devido a problemas com a sonda.
Segundo a mãe, ele iria passar por uma cirurgia para trocar a sonda. Enquanto aguardava, duas ou três vezes por mês precisava ser internado porque tinha crises. Na quarta (31), ele foi levado para o Hospital João Câncio Fernandes para tratar mais uma infecção.
Luiza estava em casa quando o acidente ocorreu preparando o pudim preferido de Izailton. O rapaz tinha falado com a mãe horas antes pedindo para ela fazer um pudim de maracujá. Luiza preparava a cauda para o doce quando foi avisada.
Ela disse que o filho mais novo e o amigo da família tentaram segurar a estrutura para não atingir Izailton. “Não aguentaram e caiu. Ele estava deitado quando veio desabando o teto. Meu filho que era indefeso, se agarrou na cama, não podia sair”, disse a dona de casa.
Conforme Luiza, um pedaço de madeira atingiu a cabeça do filho. Ele foi transferido às pressas para Rio Branco e a dona de casa conseguiu chegar à capital na manhã de sábado.
“Do tronco por dentro ficou tudo destruído. Bateu a cabeça, o médico falou que quando ele chegou já estava quase sem vida, o coração batendo bem pouquinho, teve duas paradas e não aguentou”, criticou.
Descuido
Em 2019, o Ministério Público do Acre (MP-AC) instaurou uma notícia fato para apurar as condições de funcionamento do hospital, tanto sobre o espaço físico, atendimento à população, quadro de funcionários, inclusive médicos, e medicamentos.
Após o acidente, a Sesacre divulgou uma nota lamentando a situação e afirmando que foram investidos R$ 15 milhões para reformar o hospital e melhorar o atendimento e serviços disponibilizados.
Luiza disse que já tinha percebido que o hospital não oferecia segurança para os pacientes e acredita que houve descuido e até descaso com as pessoas que precisam dos serviços.
“Não sei como estão colocando pacientes ali porque sabíamos que alguma coisa ia acontecer. Na realidade, já eram para ter derrubado ali, não sei o que estavam esperando, acho que o pior. Poderiam ter alugado um ponto, como já tinham alugado”, criticou.
O MP-AC afirmou, ainda na sexta (3), que foi instaurada outra notícia fato para apurar de quem é a responsabilidade pelo desabamento na unidade de saúde. O g1 apurou que o caso é acompanhado pela Promotoria Criminal da cidade e que o promotor de Justiça Thalles Ferreira aguarda algumas respostas e informações sobre os fatos.
Revoltada com a morte do filho, Luiza confirmou que vai processar o Estado, pedir indenização e deseja que os responsáveis sejam penalizados.
“Desejo que meu filho seja indenizado, mesmo sem vida, quero para que essas pessoas tenham mais dó pela vida das pessoas. Foi descuido da saúde”, concluiu.