“A galera gostou bastante. Então, eu comecei a fazer mais e mais filtros onde as pessoas se sintam bonitas do jeito que elas são, sem precisar mudar os traços e só valorizar a cor”, disse Rafael, que hoje tem oito filtros em seu perfil na rede social.
“A pessoa seleciona, tanto para o preto retinto quanto para o preto de pele clara. O filtro é voltado para não mudar os traços das pessoas. Nenhum filtro meu muda o traço. A única coisa que ele vai valorizar é a questão da cor e do ambiente”, explicou.
Na carreira como fotógrafo, Rafael se especializou em tirar retratos de pessoas, muitas delas negras. Ele criou um projeto em que fotografa moradores de comunidades, o que também lhe levou a tirar fotos de famosos, como MC Poze, para a capa do primeiro álbum do cantor.
“Quando eu comecei a fotografar há 10 anos, eu sentia muita falta de algo que se parecesse comigo”, contou. “Foi aí que eu comecei a ter esse olhar mais crítico e um olhar para a minha comunidade”.
“A ideia desse projeto é resgatar pessoas que moram na comunidade, pessoas comuns e transformando eles em modelos fotográficos”, conta.
Na privacidade
Os sistemas de reconhecimento facial podem ser menos precisos para pessoas que não são brancas, mas já foram adotados para segurança pública em ao menos oito estados brasileiras.
Para monitorar a adoção dessa tecnologia, o grupo O Panóptico foi criado em 2019. No final daquele ano, a iniciativa identificou 184 prisões com uso de reconhecimento facial. Dos casos em que havia dados sobre raça, a maioria dos presos eram homens negros.
“Houve alguns casos de violações, de pessoas que foram abordadas de maneira violenta, que foram confundidas e tudo mais. Então, a partir daí, a gente viu que era necessário olhar de maneira mais detida”, contou Pablo Nunes, fundador da iniciativa, em entrevista ao g1.
Para o pesquisador, o uso do reconhecimento facial em mais cidades pode aumentar o desrespeito aos direitos de pessoas negras.
“A população negra é a que mais aparece em alguns dos indicadores mais graves de violações. São os que mais morrem, são os que mais estão presos, com condenação ou sem, são os que mais têm diversas violações de seus direitos”, disse.
Pablo Nunes, coordenador adjunto do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) e fundador de O Panóptico — Foto: Renato Cafuzo
Nos últimos anos, o das dessas câmeras se espalhou no país, o que, segundo o pesquisador, foi impulsionado pelo momento político favorável às pautas de segurança pública e pelo interesse econômico de empresas, que têm oferecido a tecnologia em mais locais.
Os erros dos sistemas podem levar a prisões injustas e ao constrangimento com abordagens policiais indevidas. “No reconhecimento facial, os algoritmos erram mais com pessoas negras. Para aqueles que foram abordados e não eram a pessoa procurada, essa é uma experiência que fica”, disse.
Pablo defende o banimento do reconhecimento facial para segurança pública, como aconteceu em cidades como São Francisco e Cambridge, nos Estados Unidos. A posição é rebatida por fabricantes desses sistemas, que defendem seu uso para aprimorar algoritmos.
“Fica claro para mim que, quando efeitos perversos do uso de tecnologia recaem majoritariamente sobre pessoas negras, o erro é aceito, é [visto como] algo que faz parte para a melhoria do sistema e não importa quem sejam as pessoas que vão perder ou que vão ser violadas em seus direitos por conta desse uso “, afirma.