O Ministério Público Federal do Acre (MPF-AC) está apurando a construção de casas feitas por missionários ligados ao grupo Missões Novas Tribos Brasil (MNTB) em uma terra indígena no Alto Rio Purus, na foz do Rio Chandless, entre as cidades acreanas de Sena Madureira e Manoel Urbano, interior do Acre, da etnia Madija.
O grupo de estrangeiros norte-americanos construiu duas ou três casas na localidade sem autorização das lideranças indígenas locais ou da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), segundo o MPF.
Um desses missionários é identificado como Anthony Paul Goddard. O g1 entrou em contato com ele, que chegou a visualizar as mensagens, mas não retornou. A reportagem também pediu um posicionamento do grupo filantrópico sobre as denúncias, mas não recebeu resposta até esta publicação.
Ainda segundo o MPF, consta na denúncia que a Funai, o Distrito Sanitário Especial (Dsei) e Polícia Federal já teriam conhecimento da ocorrência dos fatos noticiados, no entanto, pouco teriam feito para apurar a ocorrência, segundo o noticiante. O órgão tem ainda a informação de que a região onde o grupo se instalou é próxima de locais de trânsito dos Mashco Piro (indígenas isolados).
Diante das informações, o MPF afirmou que tem acompanhado o que os órgãos competentes têm feito – no caso Funai e PF – por meio de requisição de documentos que comprovem a atuação no caso. Caso no decorrer do procedimento seja caracterizado algum crime de atribuição do MPF, o órgão disse que também irá apurar e tomar as providências.
O MPF-AC relatou que, em 12 de maio, a Funai notificou o grupo e deu um prazo de 30 dias para que deixassem a terra indígena, porém não houve informações sobre a desintrusão até o momento. Ainda não há denúncia formal contra os missionários.
O g1 entrou em contato com a Funai para confirmar a expulsão do grupo de missionários da terra indígena e questionar sobre as medidas adotadas pelo órgão e o impacto da presença desses indivíduos para os povos indígenas da região. Em nota, confirmou que foi feita uma fiscalização na área em maio de 2023 em parceria com a Polícia Federal.
“Durante a operação, os envolvidos foram notificados sobre a irregularidade de suas residências na Aldeia Santo Amaro, uma vez que o território é de usufruto exclusivo dos povos Huni Kuin e Madjá, conforme estabelecido por lei. Após a notificação, emitida no dia 12 de maio de 2023, os missionários em questão desocuparam o local. A Funai esclarece que as autorizações de ingresso em Terras Indígenas acontecem após a devida instrução do processo administrativo e com a anuência prévia dos representantes dos povos indígenas afetados. Neste caso, constatou-se que os missionários da Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB) não seguiram o procedimento administrativo necessário ao adentrar a Aldeia Santo Amaro”, destaca a nota.
A Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Acre) disse que não possui informações sobre o caso, pois “não trabalha” com os Madija. A reportagem também tentou contato com lideranças indígenas do povo Huni Kuī, também da região do Purus, e com o Dsei Alto Rio Purus, que informou que presta Serviços de Saúde e que acompanha o caso pela imprensa.
A Polícia Federal do Acre (PF-AC) limitou-se a dizer que está acompanhando o caso em conjunto com o MPF. No âmbito estadual, o g1 entrou em contato com a Secretaria Indígena, ligada a Secretaria de Meio Ambiente do estado, e aguarda retorno.
Sobre a TI
A Terra Indígena Alto Rio Purus tem cerca de 263 mil hectares e ocupa as cidades de Manoel Urbano e Santa Rosa do Purus e a área é habitada pelas etnias Huni Kuin, Kulina e Yaminawá.
A terra foi autodemarcada em dois momentos, no ano de 1975 (somente a margem esquerda) e em 1985 (as duas margens). Foi demarcada oficialmente em 1992 e homologada em 5 de janeiro de 1996.
Por Iryá Rodrigues, g1 AC