Ao menos cinco mortes, registradas em um intervalo de duas semanas, são associadas, pelo governo de São Paulo, ao consumo de bebidas alcoólicas contendo metanol. Os produtos, sobretudo garrafas de destilados, foram adulterados e comercializados em estabelecimentos da capital paulista e da região metropolitana. Perceber a presença da substância, contudo, é um desafio.
“É extremamente difícil identificar a presença de metanol em bebidas alcoólicas adulteradas sem testes laboratoriais, pois ele é incolor, inodoro e tem sabor semelhante ao etanol”, afirmou a médica especialista em medicina legal e perícia médica Carolina Daitx.
Em nota, o Programa de Proteção e Defesa do Consumidor do Estado de São Paulo (Procon-SP), orienta que os consumidores não tentem identificar a presença de metanol nas bebidas através do cheiro. Isso porque, além de inconclusiva, a prática pode ser perigosa ao organismo, devido ao alto teor de toxicidade da substância.
Como suspeitar se uma bebida alcoólica contém metanol
Daitx reforça a orientação, mas acrescenta que existem alguns sinais que podem indicar a adulteração, “embora não sejam métodos infalíveis de detecção”. São eles:
- Preço muito baixo: bebidas com preços significativamente abaixo do mercado podem ser um indicativo de adulteração.
- Embalagem e rótulo: lacres tortos, erros grosseiros de impressão, rótulos de baixa qualidade ou informações inconsistentes podem sugerir que o produto é falsificado.
- Odor: embora o metanol puro seja inodoro, em algumas formulações adulteradas, pode haver um odor levemente diferente, semelhante a solvente, mas isso não é um indicador confiável para o público leigo.
- Sintomas após consumo: o surgimento de sintomas como visão turva, dor de cabeça intensa, náuseas, vômitos, dor abdominal ou rebaixamento da consciência após o consumo de bebidas de procedência duvidosa deve ser tratado como uma emergência e levantar forte suspeita de intoxicação por metanol.
“A forma mais segura de evitar a intoxicação é comprar bebidas alcoólicas apenas em estabelecimentos licenciados e de confiança, verificar a integridade dos lacres e evitar bebidas de fabricação caseira ou de origem desconhecida”, recomenda a especialista.
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Não existe quantidade segura
Daitx destaca que não existe uma quantidade segura para o consumo de metanol: mesmo pequenas quantidades podem ser extremamente prejudiciais e potencialmente letais.
“Especialistas e artigos científicos são unânimes em afirmar que o metanol não se destina ao consumo humano e é altamente tóxico. A toxicidade está diretamente relacionada à dose ingerida e à capacidade individual de metabolização, mas qualquer exposição deve ser considerada uma emergência médica”, afirmou.
Ela aponta que uma dose de aproximadamente 1 g/kg de peso corporal é considerada potencialmente letal. Concentrações sanguíneas acima de 25 mg/dL já justificam tratamento intensivo.
Efeitos no organismo
Vítimas que consumiram bebidas com metanol em São Paulo relataram sintomas semelhantes ao de uma ressaca após a ingestão da substância. Isso ocorre porque, assim como o etanol, o tóxico causa embriaguez, sedação e enjoo.
Contudo, os episódios recentes se tratam de uma toxicidade muito mais grave e específica, alertou Daitx.
“A principal diferença reside no metabolismo: enquanto o etanol é metabolizado em substâncias relativamente menos tóxicas, o metanol é convertido no fígado em formaldeído e, posteriormente, em ácido fórmico e formiato. São esses metabólitos que causam os danos mais severos e específicos”, explicou.
Segundo a especialista, o ácido fórmico e o formiato se acumulam e atacam nervos e órgãos. O cérebro e os olhos são particularmente vulneráveis, o que explica os relatos de perda de visão e confusão mental.
Sobre os sintomas, a médica destaca que o metanol é conhecido por causar cegueira, que pode ser parcial ou total, devido à degeneração do nervo óptico. “Visão turva é um sintoma precoce e característico”, disse.
O tóxico pode causar ainda necrose bilateral dos gânglios da base no cérebro, levando a convulsões, coma e danos cerebrais irreversíveis. Além dos efeitos neurológicos e oculares, o metanol pode provocar insuficiência renal aguda e pancreatite.