Em Rio Preto, distrito de Marabá (PA), a extração de manganês movimenta o comércio internacional. O minério, exportado para países como Estados Unidos, China, Noruega, México e Índia, é considerado estratégico para a chamada transição energética — processo de substituição dos combustíveis fósseis por fontes de energia menos poluentes. Mas, segundo pesquisadores, essa transformação pode estar sendo usada como disfarce para velhas práticas de exploração.
Um estudo das pesquisadoras Ailce Alves e Larissa Santos aponta que, por trás do discurso de sustentabilidade, persistem graves impactos ambientais e sociais na região. Poeira, lama, risco de rompimento de barragens e conflitos entre moradores são alguns dos problemas enfrentados por comunidades próximas às minas. “A transição energética, quando guiada por interesses econômicos, tende a repetir as mesmas dinâmicas de destruição da natureza e aprofundar desigualdades”, afirmam as autoras.
O trabalho integra a coleção “Politizando o Clima: poder, territórios e resistências”, lançada na última segunda-feira (20), no Rio de Janeiro. Produzida em parceria entre a Fundação Rosa Luxemburgo, a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e o Coletivo de Pesquisa Desigualdade Ambiental, Economia e Política, a coletânea reúne reflexões sobre energia, território e a crescente mercantilização da natureza.
De acordo com a cientista social Elisangela Paim, uma das organizadoras, o objetivo é questionar as narrativas dominantes sobre o tema. “Buscamos analisar quem são os atores e interesses por trás das políticas climáticas. É preciso entender as desigualdades de classe, raça e gênero que atravessam essas agendas, além das assimetrias históricas entre o Norte e o Sul Global”, explica.
A coleção também destaca a importância das resistências locais e das comunidades que lutam contra modelos predatórios de desenvolvimento. “Há uma multiplicidade de formas de luta surgindo nos territórios. Nosso compromisso é dialogar com essas resistências e oferecer ferramentas para fortalecer a justiça socioambiental”, acrescenta Paim.
Essas discussões ganham ainda mais relevância às vésperas da COP30, conferência da ONU sobre mudanças climáticas que será realizada em Belém, no Pará, no próximo mês. O evento deve colocar em pauta a necessidade de uma transição energética justa, que não repita as desigualdades históricas.
Para David Williams, diretor do Programa Global de Justiça Climática da Fundação Rosa Luxemburgo, o cenário atual mostra uma “continuidade colonial” travestida de verde. “Os países ricos priorizam políticas ambientais em seus territórios, mas mantêm os impactos negativos nas regiões periféricas. As chamadas finanças climáticas seguem baseadas em empréstimos, e não em justiça. A promessa de reparação histórica ainda não foi cumprida”, afirma.
Segundo ele, enquanto o debate climático continuar dominado por grandes corporações e governos que buscam lucro, a crise ambiental seguirá sendo tratada como oportunidade de mercado — e não como uma urgência humana e planetária.