Opinião: Roubo de estátua de “Três Graças” entrega clímax coerente e bem amarrado pelos autores

Opinião: Roubo de estátua de “Três Graças” entrega clímax coerente e bem amarrado pelos autores

Um dos grandes acertos de “Três Graças” está na segurança com que Aguinaldo Silva, Virgílio Silva e Zé Dassilva conduzem a narrativa. O roubo da estátua que dá nome à novela das nove da Globo não nasce de um rompante, mas de um caminho cuidadosamente construído, sustentado por ações, comportamentos e decisões que vinham sendo apresentados desde o início da trama.

Nada surge do nada. Cada peça encaixa porque foi colocada antes. Até cenas de menor impacto aparente ganharam função dramática clara com o passar do tempo. O comportamento de Cristiano (Davi Luis Flores), por exemplo, que passou semanas gravando tudo com o celular, não é um artifício conveniente de última hora. É exatamente a atitude esperada de uma criança da idade dele, reforçada ao longo da história, e que se torna fundamental no momento decisivo.

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O mesmo vale para Rivaldo (Augusto Madeiro), que já vinha sendo desenhado como alguém atento, observador e investigativo. Quando ele recebe as gravações feitas pelo filho, a informação não cai do céu. Ela chega porque o terreno foi preparado, porque aquela relação e aquela dinâmica familiar já existiam.

Até situações mais delicadas foram tratadas com coerência. O tapa de Joaquim (Marcos Palmeira) em Gerluce (Sophie Charlotte), por exemplo, não aparece como um choque gratuito. A cena se sustenta dentro do perfil do personagem e do contexto em que ele se aproveita da tensão do momento para resolver questões familiares mal resolvidas, algo que em outro cenário seria visto como claramente problemático, mas que ali faz parte da lógica daquele homem.

Arminda (Grazi Massafera) também é um retrato dessa construção cuidadosa. Mesmo sob a mira de um revólver, sua reação não destoa da personagem que o público conheceu. Ao humilhar a empregada e soltar uma das falas mais ácidas da sequência, ela permanece fiel à sua essência. Não houve necessidade de suavizá-la ou exagerá-la para fazer a cena funcionar.

Outro ponto importante está nas próprias “falhas” do roubo. As pontas soltas, os erros cometidos e a falta de precisão absoluta são completamente coerentes com quem está por trás da ação. Não se trata de ladrões profissionais, mas de pessoas comuns que decidem roubar a estátua como uma forma de fazer justiça e mudar suas vidas. É natural, portanto, que o plano não seja perfeito. E é justamente aí que a novela ganha força.

Os autores não tentam transformar esses personagens em especialistas do crime da noite para o dia. Eles respeitam suas limitações, suas inseguranças e sua falta de experiência. Até o improviso faz sentido dentro dessa lógica, o que torna tudo mais humano e verossímil.

“Três Graças” mostra que novela bem escrita não precisa correr nem forçar acontecimentos. Precisa confiar no que está contando. Ao chegar ao roubo da estátua, a trama entrega um clímax sólido, coerente e fiel a tudo o que foi apresentado desde o primeiro capítulo. É o tipo de construção que valoriza o texto, os personagens e, principalmente, o espectador.

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