Servidor que agrediu procurador se aposenta com R$ 21 mil de salário

Servidor que agrediu procurador se aposenta com R$ 21 mil de salário

Um servidor de alto escalão da Câmara Municipal de São Paulo, alvo de um processo de sindicância após agredir o procurador-geral legislativo da Casa, se aposentou com um salário líquido de R$ 21 mil.

Celso Gabriel ocupava o cargo de secretário-geral administrativo, um dos mais importantes na hierarquia do funcionalismo da Câmara, quando deu um empurrão e derrubou o procurador Paulo Baccarin em meio a uma discussão sobre um contrato.

A confusão ocorreu em junho deste ano, quando a dupla se desentendeu após Gabriel pressionar Baccarin para que ele acelerasse a análise da minuta de um contrato de convênio com a Geap, empresa de autogestão em saúde que oferece planos para servidores, segundo relatou Baccarin no boletim de ocorrência.

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Após o episódio, Gabriel pegou um período de férias. Já Baccarin pediu à Mesa Diretora da Câmara que abrisse uma sindicância e demitisse o então secretário administrativo.

“A averiguação preliminar foi concluída e recomendou a abertura de sindicância, que ainda está em andamento”, informou a presidência da Câmara.

Em 22 de setembro, após pedido, Gabriel se aposentou por tempo de contribuição. Segundo a Transparência da Câmara Municipal, o salário líquido recebido após a aposentadoria é de R$ 20,9 mil.

O Metrópoles tentou contato com Celso Gabriel. O espaço segue aberto para manifestações.

Relembre a briga

  • O procurador-geral da Câmara, Paulo Baccarin, relatou em boletim de ocorrência registrado no 1º Distrito Policial da Sé a demanda sobre a minuta de um contrato, que teria chegado à procuradoria na tarde de 25 de julho. No dia seguinte, Celso Gabriel pediu uma reunião de emergência com Baccarin para conversar sobre a contratação da Geap, empresa de autogestão em saúde que oferece planos para servidores.
  • Na conversa, o secretário-geral administrativo, o cargo mais alto do setor na Câmara, teria se mostrado “atipicamente interessado” no contrato, mantendo contato direto por celular com pessoas ligadas à entidade e prometendo que o contrato seria assinado no dia seguinte, 27 de junho de 2025.
  • Ainda de acordo com o relato, com o aparente objetivo de cumprir sua promessa, Celso Gabriel passou a exigir de Baccarin, em tom ameaçador, que o parecer jurídico e a minuta de contrato fossem elaborados imediatamente.
  • Baccarin teria informado, então, que a procuradoria já estava trabalhando no assunto “com prioridade máxima” e que o expediente seria devolvido à Secretaria-Geral Administrativa ainda naquele dia, 26 de junho.
  • Na sequência, Celso Gabriel teria informado à Geap por telefone que a minuta seria entregue às 18h para revisão.
  • Em seguida, exigiu que o próprio Baccarin encaminhasse a minuta contratual finalizada diretamente à entidade privada, sem seguir o trâmite procedimental previsto no regimento interno da Câmara.
  • O procurador-geral afirmou à polícia que negou alterar os procedimentos e informou a Celso Gabriel que os documentos seriam encaminhados à Secretaria-Geral Administrativa, “em observância à norma”, para proteger os interesses jurídicos da Câmara Municipal de São Paulo.
  • A recusa teria levado Celso Gabriel a proferir as agressões verbais e físicas contra Baccarin. O procurador, que no momento estava com um dos braços imobilizados por uma tipoia, foi empurrado pelo secretário-geral administrativo e caiu em cima de uma estagiária. Ele teve de ser atendido no ambulatório médico da Câmara.
  • Após o ocorrido, a Câmara concedeu férias de 15 dias a Gabriel e instalou uma apuração preliminar sobre o caso. Além do BO na polícia, Paulo Baccarin fez uma representação junto à Mesa Diretora pedindo a abertura de sindicância e a demissão do colega.
  • Celso Gabriel foi promovido a secretário-geral administrativo pela atual Mesa Diretora no meio deste ano. Antes, ele chefiou por cerca de 20 anos o setor de Recursos Humanos do Legislativo municipal.

Contrato de saúde

A briga entre os dois servidores teve como pano de fundo uma pressão para acelerar a aprovação de um contrato com a empresa de autogestão Geap, voltada ao serviço de planos de saúde para servidores.

A operadora atualmente tem forte influência do partido Podemos, que indica seus principais quadros de chefia.

Atualmente, a Câmara adota o modelo de reembolso de planos de saúde contratados diretamente pelo vereadores, servidores e seus dependentes, por meio de um auxílio-saúde aprovado em 2018. No ano passado, a Casa desembolsou R$ 56,7 milhões em reembolsos aos funcionários e familiares.

Emenda

No dia 3 de junho deste ano, a Câmara Municipal promulgou um projeto de lei, de autoria da própria Mesa Diretora, que autorizou a Casa a celebrar convênios com empresas de autogestão para prestação de serviços de assistência à saúde para os servidores — exatamente o serviço prestado pela Geap.

Antes de ser aprovado, o texto recebeu uma emenda do vereador Gabriel Abreu, marido da deputada federal Renata Abreu, presidente nacional do Podemos.

Um dos tópicos incluídos pelo vereador prevê que os vereadores que optarem por não aderir ao convênio com a empresa de autogestão poderão receber o reembolso integral da Câmara para qualquer outro plano de saúde que contratarem, inclusive fora do limite estabelecido pelo auxílio-saúde, que atualmente chega a quase R$ 6 mil, a depender da faixa etária.

Nos bastidores, servidores interpretaram que a inclusão dos artigos serviram para facilitar a aceitação do projeto pelos vereadores, garantindo a eles a possibilidade de ter um plano de livre escolha e sem limites. De acordo com o projeto, a adesão é facultativa.

Em nota, a assessoria de Gabriel Abreu afirmou que as emendas foram pontuais e “não impactam o mérito central ou a finalidade da propositura”.

Já a Mesa Diretora argumenta que o modelo de convênio com empresas de autogestão serve para dar uma alternativa aos funcionários.

“As entidades de autogestão destacam-se por sua eficiência administrativa, custos reduzidos e foco na qualidade do atendimento. Diferentemente das operadoras comerciais, essas entidades não visam lucro, o que permite maior flexibilidade na gestão dos recursos e personalização dos serviços prestados”, afirmou, em nota, a presidência da Câmara.

Em outubro, cerca de um mês após a aposentadoria de Celso Gabriel, a Câmara firmou o contrato de convênio com a Geap no valor de R$ 10 milhões por dois anos de vigência.

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