O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, se irritou com a divulgação pelo jornal Folha de S. Paulo de que as Forças Armadas pretendem fazer uma espécie de “apuração paralela” no dia da eleição e decidiu desmarcar uma reunião prevista para esta terça-feira (13), com o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira.
O encontro não estava previsto na agenda oficial de Moraes, mas até a noite do último domingo (11) a equipe das Forças Armadas havia recebido confirmação extra oficial do tribunal e se preparava para a audiência.
A equipe da coluna apurou que Paulo Sérgio e Moraes trocaram mensagens nesta segunda-feira (12) para distensionar o ambiente e tentar reagendar o encontro.
O principal assunto a ser discutido é a adoção de um projeto piloto para mudar o Teste de Integridade das urnas. As mudanças no teste são o último remanescente de uma longa lista de pedidos apresentados pelos militares ao TSE no início do ano e que alimentaram a guerra pública entre Bolsonaro e a corte eleitoral.
Nas últimas semanas, ministros do governo Bolsonaro, militares e o TSE vinham costurando um armistício que desaguou em um encontro de Nogueira e Moraes no último dia 31 na sede do TSE – e, esperavam os militares, selaria o final da pendenga.
A história da “apuração paralela” pegou a corte eleitoral de surpresa e interrompeu as conversas.
Segundo reportagem da Folha, os militares planejam pegar 385 boletins de urna (BUs) aleatoriamente para cruzar os dados compilados pelos militares com a apuração do TSE.
A disponibilização dos BUs no site oficial do tribunal, não apenas aos militares, mas a qualquer um, era uma medida já anunciada há meses. O número de boletins que os militares pretendem vasculhar por conta própria só foi revelado agora.
Segundo a equipe da coluna apurou, Moraes se irritou com a “guerra de narrativas” em torno do sistema eleitoral brasileiro.
Para o ministro, somar BUs não é “apuração paralela”, já que para isso seria necessário somar todos os boletins das mais de 400 mil urnas, o que seria impossível.
O ministro também se irritou com a versão de que a tal “apuração paralela” seria um privilégio aos militares, quando na verdade “não houve nenhuma alteração do que definido no primeiro semestre, nem qualquer acordo com as Forças Armadas ou entidades fiscalizadoras para permitir acesso diferenciado”, segundo o próprio TSE destacou em nota pública.
Conforme informou a coluna, nas eleições de 2020, uma ONG decidiu fazer uma “apuração paralela” por conta própria, somando dezenas de boletins de urna — e não encontrou inconsistências quando comparou os números com aqueles divulgados pelo TSE.
Esses boletins — uma espécie de extrato com os votos computados em cada urna — são impressos e fixados em cada seção eleitoral ao fim da votação. No início do ano, o TSE já havia informado que ia disponibilizá-los também na internet.
Ou seja: as Forças Armadas poderão somar quantos BUs quiserem, assim como qualquer outro brasileiro com acesso à internet que visitar o site do TSE no dia da eleição.
Integrantes do tribunal também rechaçaram a versão de que o tribunal vai disponibilizar os dados brutos da votação.
Depois da divulgação do plano dos militares, alguns dos envolvidos na iniciativa alegaram à equipe da coluna que o que será feito não é uma “apuração paralela” e sim uma checagem da totalização por amostragem — o que, sim, poderia ser feito por qualquer entidade ou qualquer pessoa.
O principal ponto em negociação entre militares e o TSE envolve não os BUs, mas as mudanças no Teste de Integridade, uma das principais etapas de auditoria do processo eleitoral brasileiro.
Os militares querem que a testagem seja feita em ao menos 27 capitais com o uso da biometria de eleitores no próprio dia da eleição em seções eleitorais.
Hoje o teste de integridade é feito sem o uso da biometria, mas os militares insistem no procedimento para reproduzir o teste nas condições mais similares à votação real.
Moraes tem sinalizado que vai analisar a escala possível para implantar o projeto-piloto, e a última conversa sobre esse assunto estava prevista para ocorrer na terça. Os militares tem urgência em resolver esse assunto, até porque faltam 20 dias para a eleição. Quanto mais demora, portanto, menor a chance de haver qualquer acordo entre os militares do governo e Alexandre de Moraes.