Uma professora foi indiciada por agressão a uma criança e por obrigar outras duas a comerem massa de modelar, em Cruzeiro do Sul, no interior do Acre. Outras quatro pessoas, que trabalhavam na escola, foram indiciadas em outro processo por omissão. Após a repercussão do caso, a professora foi transferida para outra cidade.
O g1 conversou com o delegado Renan Santana, titular da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher e de Proteção à Criança e ao Adolescente (Dempca). Segundo ele, os crimes aconteceram em agosto de 2023, e, na época dos fatos, o município não instaurou nenhum procedimento para investigar o caso. A escola também não denunciou o episódio à autoridades.
Por envolver menores, o caso é investigado em sigilo e os nomes dos investigados e da escola não foram divulgados.
Funcionários teriam se omitido
De acordo com o delegado, duas investigações foram abertas. A primeira foi contra a professora, que teria sido flagrada em um vídeo puxando a orelha de um aluno e forçando outros dois estudantes a comerem massa de modelar.
Na segunda investigação, o delegado averiguou o fato de servidores da escola não terem comunicado o crime às autoridades. “Eu percebi que não se tinha feito nada administrativamente, então eu passei a investigar os agentes públicos. Aí, com base nisso, foi que eu fiz uma outra investigação. Foram duas investigações distintas”, diz ele.
A investigação sobre a omissão dos agentes públicos foi baseada no artigo 26 da lei Henry Borel, que diz que é crime deixar de comunicar à autoridade pública a prática de violência, de tratamento cruel ou degradante ou de formas violentas de educação, correção ou disciplina contra criança ou adolescente ou o abandono de incapaz. O artigo prevê a pena de detenção de seis meses a três anos.
“Era uma situação grave e que estava filmada, feita dentro da sala de aula e demonstra o episódio da professora. Estava comprovado ali, não tinha dúvida para ficar pensando se deveria chamar a polícia ou o Ministério Público ou alguém. O município não instaurou nenhum procedimento, não fez nada, aí foi feita a investigação nesse sentido”, comenta o delegado.
O delegado diz que uma parte dos servidores envolvidos confessou a autoria do delito. A professora foi investigada pela infração penal do artigo 136 do Código Penal, crime de maus-tratos, com a causa de aumento de pena em virtude da idade da vítima (aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 anos).
O artigo 136 diz que expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina, prevê a detenção de dois meses a um ano, ou multa.
Os próximos passos do processo, segundo Santana, será a disponibilização do procedimento investigativo ao Poder Judiciário, ao Ministério Público do Acre, para que seja oferecida a denúncia e solicite diligências à Polícia Civil ou o arquivamento da investigação, que tramita em segredo de justiça para preservação da criança.
Família foi ouvida
Santana disse que a família de uma das crianças agredidas foi ouvida, porém não foi realizado exame de corpo de delito, em virtude de já ter passado muito tempo e provavelmente o desaparecimento de lesões que porventura tivessem existido.
Professora foi transferida para outro município
O secretário municipal de Educação, Esporte e Lazer de Cruzeiro do Sul, Edvaldo Gomes de Oliveira, disse que a professora não era do município e estava emprestada para suprir o quadro de funcionários. “A professora era num sistema de permuta, ela não pertencia ao quadro do município de Cruzeiro do Sul, ela estava permutada do município de Marechal Thaumaturgo. O procedimento foi fazer imediatamente a devolução dela para o município de origem e fazer a substituição para que não houvesse prejuízo no ensino das demais crianças e da criança envolvida”, afirmou ele.
Oliveira ainda disse que os procedimentos administrativos contra os servidores foram tomados de forma imediata e a assistência à criança foi prestada. “O fato do ponto de vista administrativo, é de que as medidas administrativas foram tomadas à época. Isso foi no ano passado. A escola, pelo que eu sei, deu toda a assistência que a criança precisou após o ocorrido”, comenta.
O secretário esclarece que os outros servidores irão responder de “alguma maneira” e a gestão foi toda trocada após eleições internas da escola. “Uma das pessoas envolvidas não é mais a diretora, teve eleição e mudou. Acredito que toda a direção teve que mudar por conta da eleição, agora é uma nova gestão”, diz Oliveira.
Prefeitura repudia ocorrido
Na última sexta-feira (26) a prefeitura de Cruzeiro do Sul divulgou uma nota de repúdio após o episódio se tornar público. (Confira a nota completa abaixo)
Em uma publicação feita nas redes sociais da prefeitura, o prefeito Zequinha Lima, declarou que medidas imediatas foram tomadas em resposta aos acontecimentos, incluindo o afastamento dos envolvidos. Além disso, disse que a prefeitura está colaborando integralmente com as autoridades policiais para esclarecer completamente a situação.
NOTA DE REPÚDIO DA PREFEITURA DE CRUZEIRO DO SUL
“A Prefeitura de Cruzeiro do Sul vem a público manifestar seu total repúdio a qualquer forma de violência escolar. Considera inadmissível que alunos sejam vítimas de maus-tratos em um ambiente educacional.
Diante dos recentes acontecimentos envolvendo denúncias de violência contra um aluno de Escola da Rede Municipal de Ensino, informa que afastou os envolvidos nas denúncias e colabora integralmente com as autoridades policiais para investigar e esclarecer toda a situação.
Reforça o compromisso com a educação e com o respeito aos direitos das crianças e dos adolescentes, e reitera que não medirá esforços para garantir um ambiente escolar seguro e acolhedor para todos.
Prefeito – José de Souza Lima (Zequinha Lima)”
Via G1 Ac