Por Raphael Barbieri, CCLA Advogados
A Polícia Federal indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro e outras 36 pessoas em inquérito que apura uma tentativa de golpe de Estado em 2022. Entre os crimes atribuídos ao capitão estão a abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa. Cada um desses delitos apresenta particularidades jurídicas. Diferenciam-se, contudo, nas fases de investigação quanto nos processos judiciais.
Além disso, há outros inquéritos: o de fraude em cartões de vacinação e o da venda irregular de jóias recebidas durante o exercício do mandato. Isso interfere diretamente na proteção dos princípios fundamentais da Constituição, que garante a proteção da organização política e jurídica do país.
O crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito está previsto no artigo 359-L do Código Penal. Enquadra-se à Lei aquele que, mediante violência ou grave ameaça, queira cercear o Estado Democrático de Direito, impedindo e restringindo o exercício dos poderes constitucionais. A pena varia de 4 a 8 anos de reclusão.
Já o golpe de Estado, previsto no artigo 359-M do Código Penal, ocorre quando alguém tenta depor, também por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído. A punição para esse delito é ainda mais severa, variando entre 4 e 12 anos de reclusão.
Ambas as tentativas são puníveis. A gravidade está relacionada com o risco direto à estabilidade política e à soberania das instituições democráticas. Conforme o contexto em que ocorreram os fatos, especialmente com a coordenação de ações contra a posse de Lula, em 2022, agrava-se a análise das condutas investigadas.
Por sua vez, a Lei nº 12.850/2013 regula o crime de organização criminosa. Ele ocorre quando quatro ou mais pessoas se associam estruturadamente, dividindo tarefas, para obter vantagens mediante a prática de infrações penais. A pena máxima é superior a 4 anos e tem caráter transnacional.
A pena prevista é de 3 a 8 anos de reclusão, além de sanções adicionais aplicadas por meio de atos específicos da organização. Nesse caso, a análise jurídica se concentra na estruturação da associação e no objetivo comum dos integrantes, que, segundo as investigações, incluía tanto a tentativa de golpe quanto outros crimes de menor potencial ofensivo.
Os inquéritos que provocaram o indiciamento de Bolsonaro possuem particularidades. Entre as apurações, estão planos de assassinar autoridades como o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Esses fatos indicam uma ampla articulação, que envolveu diversos atores em diferentes níveis de poder.
Outro inquérito relevante é o que trata da fraude em cartões de vacinação. Nesse caso, as investigações apontam que dados falsos foram inseridos nos sistemas oficiais de controle de vacinação contra a Covid-19, supostamente para burlar restrições sanitárias impostas em diferentes locais do país e no exterior. Configuram-se falsidade ideológica e inserção de dados falsos em sistemas de informação. As penas variam conforme a gravidade da situação.
O inquérito que apura a venda irregular das jóias recebidas durante o mandato presidencial aborda crimes como peculato e lavagem de dinheiro. Segundo as investigações, Bolsonaro e seus associados negociaram de forma ilícita bens que deveriam integrar o patrimônio público. Tais objetos foram presentes oficiais ao governo brasileiro. Esses crimes podem tramitar na Justiça Federal.
O Ministério Público Federal (MPF) atua nessas acusações, e o processo segue as etapas tradicionais: oferecimento da denúncia, instrução, alegações finais e julgamento. A principal diferença nesses casos está na competência do juízo e na ausência de prerrogativas de foro especial, caso o investigado não ocupe mais cargos públicos que garantam o benefício.
Os processos judiciais derivados dessas investigações apresentam diferenças importantes quanto à tramitação e às esferas de competência. No caso da tentativa de golpe de Estado, devido à gravidade e ao envolvimento de altas autoridades, o caso tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). Após o indiciamento, a Procuradoria-Geral da República (PGR) fará uma denúncia. Caso esta seja acatada, a ação penal tem início. Essa fase inclui a instrução processual, na qual são colhidas provas e ouvidas testemunhas, seguida pela apresentação da defesa e, finalmente, pelo julgamento.
As investigações envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro têm implicações profundas para a democracia brasileira, não apenas pelo conteúdo das acusações, mas também pelo impacto político e social que esses casos representam. A sociedade deve acompanhar atentamente o desenrolar dessas ações, cobrando transparência e justiça, de modo que as instituições mantenham sua credibilidade e o país avance no fortalecimento do Estado de Direito.