Para muitas pessoas, a celebração do fim de ano, especialmente no Réveillon, é um momento de alegria e confraternização. No entanto, as tradicionais festas com fogos de artifício podem gerar sofrimento para diversos seres vivos, provocando ferimentos, sequelas e até mortes devido aos fortes estampidos dos rojões.
Os fogos de artifício são uma tradição secular em muitas partes do mundo, mas para animais domésticos e silvestres, bem como para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) ou sensibilidade sonora elevada, esses sons podem ser extremamente prejudiciais. Especialistas têm se manifestado sobre o impacto desses ruídos e alertado sobre a necessidade de regulamentação e conscientização. Inclusive, o Congresso Nacional analisa um projeto de lei que visa proibir artefatos pirotécnicos que emitem sons de alto impacto.
Impacto nos Animais
Os animais possuem uma audição muito mais aguçada do que os seres humanos. No caso dos cães, por exemplo, eles conseguem ouvir sons até quatro vezes mais distantes, e com frequências muito mais altas. Quando ouvem os fogos, que produzem estampidos repentinos e intensos, eles interpretam o som como uma ameaça iminente, o que pode causar pânico e reações extremas, como tentativas de fuga, quedas e até problemas de saúde graves, como infartos, em casos mais extremos.
Os efeitos não se limitam aos animais domésticos. A fauna silvestre também é gravemente afetada pelos ruídos. As aves, por exemplo, podem sofrer ataques cardíacos devido ao estresse causado pelos estampidos, e mamíferos e répteis podem entrar em pânico, se expondo a predadores ou acidentes. Além disso, os padrões de alimentação, reprodução e migração de diversas espécies podem ser alterados, prejudicando o equilíbrio ambiental.
Uma pesquisa recente do Grupo Petlove revelou que a maioria dos animais domésticos tem medo de fogos de artifício. Dos tutores entrevistados, 72,7% afirmaram que seus animais tentam se esconder, 58,1% notaram que os pets ficam assustados, e 52,3% observaram tremores causados pelo pânico.
No Distrito Federal, a ativista Andréia Maia relatou que já perdeu dois animais devido ao estresse causado pelos fogos no Ano Novo. “Eles convulsionaram por causa do barulho. Tentamos tranquilizar, mas pouco funciona”, contou.
Legislação no Acre
No Acre, a Lei Estadual nº 3.773, aprovada em abril de 2022, proíbe a venda e o uso de fogos de artifício barulhentos em todo o estado. A legislação foi proposta pelo deputado estadual Pedro Longo, em coautoria com a deputada Meire Serafim, e visa proteger não apenas os animais, mas também pessoas com condições sensoriais especiais. De acordo com a lei, fogos com estampidos são proibidos, e apenas os que têm efeitos visuais, sem emissão de ruídos excessivos, podem ser utilizados.
Além do Acre, outras regiões do Brasil, como Goiás, Amapá, São Paulo e Belo Horizonte, também possuem legislações que proíbem a comercialização e o uso de fogos com estampidos acima de uma determinada intensidade. Em outubro de 2024, o Senado Federal aprovou um projeto de lei que propõe a proibição nacional do uso de fogos com ruídos altos, com exceção dos destinados à exportação.
No Distrito Federal, uma lei de 2020 proíbe a comercialização e uso de fogos barulhentos, e as autoridades locais buscam uma maior fiscalização. O Instituto Cultural e do Bem-Estar Animal (ICBEM), em Brasília, lançou uma campanha de conscientização, defendendo o uso de fogos de baixo impacto sonoro, que oferecem um espetáculo visual igualmente bonito, mas sem os danos à saúde de pessoas e animais.
Impacto nas Pessoas
Além dos danos aos animais, fogos de artifício com estampidos também afetam pessoas com transtornos sensoriais, como o TEA. Mila Guimarães, autista de Belo Horizonte, compartilhou sua experiência pessoal, destacando que os fogos de artifício a deixam em pânico. “Eu já fui parar várias vezes no hospital devido ao impacto desses sons”, afirmou.
A psiquiatra Ana Aguiar, que também é autista, explicou que os autistas podem sentir uma variedade de sintomas devido à hipersensibilidade auditiva, como cefaleia, desorientação e até crises de pânico, o que torna essencial a adaptação de eventos para garantir que essas pessoas não sofram com os ruídos.
Enquanto a legislação avança para proteger tanto os animais quanto as pessoas, especialistas dão orientações para minimizar os impactos dos fogos. Para os animais domésticos, é recomendável criar um ambiente seguro em casa, com acesso a locais fechados e cobertores. Sons suaves, como música relaxante, podem ajudar a mascarar os barulhos. Em casos graves, a orientação veterinária é necessária.
Para pessoas sensíveis aos ruídos, a preparação antecipada é essencial. Fones de ouvido com cancelamento de ruído ou tampões de ouvido podem ajudar a reduzir os efeitos dos estampidos.
À medida que mais pessoas se conscientizam dos danos causados pelos fogos de artifício barulhentos, cresce a pressão para que mais estados e municípios adotem legislações restritivas e para que as celebrações de fim de ano se tornem mais inclusivas e respeitosas.