O Ministério Público do Estado do Acre (MPAC) anunciou que irá recorrer da decisão judicial que rejeitou a ida do empresário Tarcísio Araújo da Mota, conhecido como Tarcísio do Som, a júri popular. Ele é investigado pela morte de sua esposa, a cantora Nayara Vilela, que morreu em abril de 2023 em sua residência, em Rio Branco, com um tiro na cabeça.
O caso gerou grande comoção à época, e desde então, o MPAC mantém a tese de que o empresário teve participação omissiva no crime, o que justificaria sua responsabilização por homicídio comissivo por omissão. No entanto, o juiz Alesson Braz, da 2ª Vara do Tribunal do Júri e Auditoria Militar de Rio Branco, entendeu que não havia indícios suficientes para que Tarcísio fosse julgado pelo Tribunal do Júri, que é o órgão competente para crimes dolosos contra a vida.
Na decisão, o magistrado apontou a ausência de provas que indicassem dolo – ou seja, intenção ou aceitação do risco de matar – por parte do réu. Por isso, desclassificou o caso para análise em outro juízo, que pode tratar do tema sob o ponto de vista de eventual omissão ou falha na guarda da arma.
Contudo, o MPAC discorda dessa interpretação. Para o órgão, Tarcísio teria ignorado sinais evidentes da fragilidade emocional de Nayara, que já apresentava histórico de tentativas de suicídio. Além disso, manteve uma arma de fogo acessível dentro da casa, mesmo com o conhecimento do quadro da esposa. Tais elementos, segundo a promotoria, demonstram que ele tinha o dever legal de agir para impedir o desfecho fatal, mas foi negligente.
O Ministério Público defende que Nayara Vilela foi vítima de um contexto de violência de gênero, marcado por negligência e relações de poder que fragilizaram ainda mais sua condição emocional. Por isso, além de recorrer da decisão, o MPAC anunciou que solicitará a aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, estabelecido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para que o caso seja analisado à luz da desigualdade estrutural enfrentada por mulheres em relações afetivas abusivas.
A promotoria acredita que o caso se enquadra em uma nova compreensão jurídica que não trata o suicídio isoladamente, mas considera o contexto que pode ter contribuído para a morte. Nesse sentido, Tarcísio seria responsável por não ter evitado o ato extremo, mesmo tendo meios e o dever de fazê-lo.
A morte da cantora Nayara Vilela, conhecida no meio artístico acreano e nas redes sociais, ocorreu em abril de 2023. Na ocasião, foi divulgado que ela teria tirado a própria vida, mas o Ministério Público passou a questionar essa versão, pedindo a responsabilização de Tarcísio. Desde então, o processo judicial tem avançado com fases de depoimentos, perícias e manifestações do MPAC e da defesa.
Com a desclassificação feita pelo juiz, o caso será reavaliado por outra instância da Justiça, que poderá apurar a existência de crime culposo (sem intenção) ou mesmo omissão de cautela na guarda da arma. Ainda assim, o MPAC segue convicto da necessidade de julgamento no Tribunal do Júri e irá apresentar recurso nos próximos dias para reverter a decisão.
A defesa de Tarcísio do Som, por sua vez, sustenta que ele não teve qualquer responsabilidade sobre a tragédia e que não havia como prever ou impedir o ocorrido. Alega ainda que ele cooperou com as investigações e que sofre com as acusações injustas que abalam sua imagem e trajetória profissional.
Enquanto o caso segue sem desfecho definitivo, a população acreana acompanha com atenção os desdobramentos de um processo que reacende discussões sobre saúde mental, violência doméstica, porte de armas e responsabilidades legais nas relações afetivas. O desfecho judicial poderá, inclusive, influenciar futuros entendimentos em situações semelhantes.