
A sessão da Câmara dos Deputados realizada em 9 de dezembro, marcada pela aprovação do projeto que reduz penas de condenados pelos atos golpistas de 2022 e pelo 8 de Janeiro, foi também palco de uma polêmica envolvendo o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB). Em resposta a críticas do deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), Motta afirmou que o Partido dos Trabalhadores “não assinou” e “votou contra” a Constituição de 1988 — uma desinformação já disseminada no passado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e há anos desmentida por registros oficiais e especialistas.
A fala ocorreu quando Lindbergh criticava a aprovação do PL 2162/2023, conhecido como PL da Dosimetria, de Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), que diminui as penas de envolvidos nas ações antidemocráticas. Motta reagiu dizendo que era “incoerente” citar Ulysses Guimarães, porque petistas teriam se posicionado contra a Constituição.
Benedita da Silva rebate imediatamente
A deputada Benedita da Silva (PT-RJ), que integrou a Assembleia Nacional Constituinte e assinou a Constituição de 1988, pediu a palavra para corrigir a afirmação. Em plenário, com um exemplar da Carta Magna em mãos, leu em voz alta nomes da Mesa Diretora — incluindo o seu próprio — confirmando sua participação como signatária do documento. Ela lembrou que toda a bancada do PT assinou a Constituição.

Mesmo assim, Motta insistiu na fala. Benedita voltou a corrigir o colega, destacando que o presidente da Câmara descumpriu o Regimento Interno ao emitir opinião política sem transferir a condução da sessão a outro parlamentar, como a norma exige. Para ela, além de violar o regimento, Motta alimentou uma narrativa que distorce a história e compromete o debate democrático.
Depois da correção, o deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB) reforçou a mesma falsidade, repetindo a estratégia de transformar declarações equivocadas em discursos prontos para circular nas redes sociais.
A declaração de Motta não é inédita. Durante a campanha presidencial de 2022, Jair Bolsonaro afirmou em uma live que o PT não havia assinado a Constituição. A fala foi desmentida diversas vezes, já que os registros oficiais comprovam a assinatura de vários constituintes petistas, entre eles Benedita da Silva, José Genoíno, Plínio de Arruda Sampaio e José Ibrahim.
O que realmente ocorreu na Constituinte
Embora o PT tenha votado contra o texto final da Constituição — por considerar que ainda havia lacunas nos direitos sociais — o partido participou integralmente dos trabalhos, ajudou a redigir artigos, desempenhou funções na Mesa Diretora e assinou o documento que entrou em vigor em 1988. A assinatura e o voto são atos distintos, e o partido nunca se recusou a assinar a Carta Magna.
Benedita da Silva, primeira mulher negra e evangélica a participar da Constituinte, teve atuação destacada em debates sobre direitos das trabalhadoras domésticas, igualdade racial, liberdade religiosa e proteção a minorias. Sua trajetória, marcada por participação ativa na construção da Constituição, desmente qualquer alegação de ausência do PT no processo.

Em depoimento ao Coletivo Memória & Utopia, Benedita reafirmou seu compromisso com a democracia:
“Assinamos sim a Constituição, com toda a bancada. Estávamos lá escrevendo, com o Brasil, uma carta de direitos.”
A tentativa de reavivar uma desinformação já refutada não apenas ignora a história, mas também tensiona o ambiente político em um momento em que, mais do que nunca, a verdade e o respeito institucional são essenciais para o funcionamento da democracia.






