25 novembro 2024

Seca histórica no Acre: população desconhece gravidade da crise hídrica

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O estado do Acre está enfrentando uma seca sem precedentes, com volumes de água nos rios drasticamente reduzidos nas últimas semanas. Este cenário crítico ameaça a estabilidade das cidades na região amazônica, que já foi sinônimo de abundância de água doce. Pesquisadores, professores, gestores ambientais e a Defesa Civil do Acre estão buscando soluções, mas as ações práticas ainda são escassas.

Segundo o coronel Batista, coordenador da Defesa Civil do Acre, a inundação do Rio Acre em fevereiro de 2024, seguida pela menor cota dos últimos 52 anos, deu início a um agravamento rápido da seca. “Os níveis dos rios estão muito baixos e devem continuar baixando. Na Bacia do Juruá, a situação é a mesma, com cotas abaixo das previsões”, alerta o coronel.

Em Rio Branco, Antônio Viana, catraieiro há 24 anos, enfrenta dificuldades para realizar a travessia de pessoas devido à erosão das margens e à escassez de água. “Antes, eu conseguia atravessar facilmente. Agora, tenho que descer o rio e subir pelo outro lado para não ficar encalhado. Em breve, acho que o rio vai secar tanto que será possível atravessá-lo a pé”, desabafa Antônio.

A apenas 30 metros do local da entrevista, um esgoto a céu aberto despeja líquido preto e fétido no Rio Acre, que abastece toda a cidade de 413 mil habitantes, conforme o censo de 2020.

O tenente-coronel Cláudio Falcão, da Defesa Civil de Rio Branco, informou que quase 20 mil pessoas em comunidades rurais estão sendo abastecidas por caminhões-pipa devido à seca na capital. “Quando comecei a gestão em 2021, atendíamos 10 comunidades. No ano passado, foram 29, e este ano o número será ainda maior”, explica Falcão.

No interior do Acre, a situação é igualmente alarmante. Aécio Silva dos Santos, engenheiro florestal e chefe do Núcleo de Gestão Integrada do ICMBio em Sena Madureira, destaca que a cheia dos rios Caeté e Macauã não atingiu os níveis esperados, antecipando a seca. “Temos igarapés secos nesta época do ano e comunidades isoladas devido ao baixo nível dos rios”, conta Aécio.

Em Porto Walter, Edvaldo Nogueira enfrenta dificuldades no transporte de mercadorias pelo Rio Juruá, principal rota de acesso à cidade. “Meu barco afundou no verão passado, e agora dependo de outros para trazer ração para minha granja. A viagem que antes durava um dia agora leva três, e se as galinhas ficarem uma manhã sem comer, são 15 dias sem ovos”, explica Edvaldo.

O professor Alexsande de Oliveira Franco, da Universidade Federal do Acre, membro do Comitê de Secas da ANA e pesquisador do IPEA, aponta que os fenômenos El Niño e La Niña, intensificados pela ação humana, são responsáveis pela seca severa. “Esses fenômenos estão ocorrendo com mais frequência e intensidade devido à queima de combustíveis e desmatamentos. A previsão era de um aumento de 1,5ºC na temperatura do planeta até 2030, mas já estamos vendo isso agora”, explica o professor.

Alexsande também observa que a floresta amazônica está perdendo a capacidade de se reequilibrar, com um solo mais seco mesmo em áreas de alta densidade florestal. “A evapotranspiração acelerada faz com que as plantas percam mais água do que conseguem repor, levando à seca dos rios e igarapés”, completa.

Apesar dos riscos evidentes, a população parece alheia à gravidade da situação. “As pessoas só se importam com a água quando ela falta. A sociedade precisa pressionar o poder público por soluções, pois sem água, não sobrevivemos”, alerta Alexsande. Ele enfatiza a importância da educação nas escolas, órgãos públicos e empresas privadas para conscientizar a população sobre a crise hídrica.

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