26 julho 2024

Mais de 400 pessoas vivem em situação de rua em Rio Branco, diz Centro de Referência

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Um problema antigo e complexo em Rio Branco cresce a cada atualização de dados: o número de pessoas em situação de rua. Segundo o Centro de Referência Especializado para Pessoas em Situação de Rua, também conhecido como Centro Pop, 420 pessoas estão sob estas condições. Ou seja, 95 a mais que 2021, quando foram contabilizadas 325 nesta situação.

Ainda de acordo com os números, a maior parte deste número vive no Centro da capital acreana. Jorfan Valentim, por exemplo, faz parte das estatísticas. Há oito meses, ele come, dorme e sobrevive nas ruas.

Após perdas familiares, a depressão e o alcoolismo tiraram a dignidade do homem que perdeu o contato com a família. Além disso, o preconceito também maltrata.

“Me aprofundei mais na depressão, meu casamento acabou, meu pai morreu, minha avó que me criava, morreu, e tudo isso abate a pessoa tanto no psicológico como no físico […] a sociedade me discrimina, nós que estamos passando por esse processo. Uns amigos meus ficam ‘rapaz, tu tá nessa?’, olhando com discriminação”, disse.

Jorfan vive nas ruas de Rio Branco e diz que tenta sair da situação em que vive — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

Jorfan vive nas ruas de Rio Branco e diz que tenta sair da situação em que vive — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

Apesar da situação em que vive, Jorfan diz acreditar que vai conseguir sair das ruas.

“A esperança é a última que morre para quem crê em Deus, né?! E eu creio em Deus e sei que ele existe. Está faltando da minha parte só eu tomar uma atitude também, porque eu ainda não tomei uma atitude, falou.

Um ano atrás

No dia 15 de fevereiro de 2022, uma reportagem foi exibida no Jornal do Acre 2ª Edição acerca desta problemática na capital acreana. Um dos entrevistados era o seu Albanir de Menezes Silva, que vivia em situações semelhantes as quais vive Jorfan atualmente. Na época, ele contou que estava há 1 ano vivendo longe da família.

Agora, tornou-se perceptível algo que não era visto na última conversa: o sorriso estampado no rosto. Isto porque atualmente, ele tem um lugar para ficar.

“Falta só arrumar um emprego, voltar a trabalhar direito”, complementou.

Albanir de Menezes sonha em voltar a trabalhar — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

Albanir de Menezes sonha em voltar a trabalhar — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

Ele também faz algumas refeições no Centro Pop, que concede alimentação diária, local para higienização, encaminhamentos para as unidades de saúde, bem como reabilitação para tratamento de dependentes químicos e atendimento psicossocial.

De acordo com o diretor de Assistência da Secretaria De Assistência Social e Direitos Humanos (Sasdh) do município, Jéfferson Barroso, em média 125 pessoas almoçam no local.

Vício

A dependência química é o que leva muitos para as ruas. Barroso pontua ainda que o processo de desintoxicação também precisa partir de uma decisão do próprio usuário.

“A complexidade (dos casos) é uma questão de saúde pública no Brasil inteiro. Ainda não há uma clareza no processo de desintoxicação. A fase de se chegar a uma comunidade terapêutica é justamente após ter passado por uma série de atendimentos, que também depende do usuário”, destacou.

Diretor da Sasdh fala que mais de 100 refeições de almoço são distribuídas às pessoas em situação de rua — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

Diretor da Sasdh fala que mais de 100 refeições de almoço são distribuídas às pessoas em situação de rua — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

“Conta que não fecha”

O Núcleo de Apoio e Atendimento Psicossocial (Natera) do Ministério Público do Acre (MP-AC) estima que existam em torno de 500 pessoas em situação de rua na capital. O MP atende essa população e fiscaliza para que direitos sejam garantidos.

A instituição aponta ainda que os serviços oferecidos pelo poder público estão defasados.

“O mesmo conjunto de serviços e equipamentos do ano de 2012 para aquela realidade é o mesmo conjunto de equipamentos e serviços em 2023, sendo que a população quadruplicou desde lá até agora. É uma conta que não fecha. Alguém vai ficar sem atendimento e esse atendimento pode não ser tão efetivo como poderia ser”, frisou o coordenador do Natera, Fábio Fabrício.

Fábio Fabrício, do Natera, diz que estratégias ainda não suprem o problema das pessoas em situação de rua — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

Fábio Fabrício, do Natera, diz que estratégias ainda não suprem o problema das pessoas em situação de rua — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

“Superar a dependência química não é fácil”

Mesmo diante dessa realidade de pouca esperança, existem exemplos de superação. Foi embaixo das pontes do Centro de Rio Branco que Sidney, por exemplo, viveu por quase 12 anos. A dependência química destruiu todas as oportunidades do jovem que foi jogador de futebol e que até chegou a fazer testes na Itália.

“A pessoa só pensa em fazer uso de entorpecente, não toma banho, não tem alimentação adequada […] falei: ‘não, agora é hora de parar, de mudar de vida’. Se eu não procurar mudar de vida, ninguém vai mudar por mim. Tomei atitude, fui pro centro de recuperação e tenho dias em sobriedade”, destacou.

Sidney viveu por 20 anos nas ruas e hoje se recupera da dependência química — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

Sidney viveu por 20 anos nas ruas e hoje se recupera da dependência química — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

No total, foram 20 anos nas ruas. Sidney tem 41 anos e passou mais de um em um centro de recuperação, onde aprendeu a ter um novo estilo de vida e ainda conheceu a agora esposa, Josineide Aguiar. Um ajuda o outro a vencer a luta diária contra a dependência. Agora, ambos moram em uma casa, têm emprego e família.

“Se Deus mudou minha vida, que eu também sou dependente química em recuperação, podia mudar a dele. Assim vivemos juntos e está dando certo. Foram cinco anos esperando um esposo, pedindo de Deus e Deus enviou ele, do jeito que eu pedi. Se eu tiver sonhando, não me acordem. Se eu tiver acordado, ninguém me deixe dormir”, disse, rindo.

Josineide, também em processo de tratamento, conheceu o agora marido em uma clínica de recuperação de dependentes químicos — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

Josineide, também em processo de tratamento, conheceu o agora marido em uma clínica de recuperação de dependentes químicos — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

A história dele é a prova de que há saídas, sim, no labirinto das ruas.

“Quando eu passo e olho as pessoas que andavam comigo naquela época, a gente sente pena mas eu vejo que estou conseguindo para minha vida. É possível (sair das ruas) sim, basta acreditar, ter fé em Deus e se superar a cada dia, porque superar a dependência química não é fácil. Mas quem disse que viver é fácil?”, falou.

Por Eldérico Silva, Jornal do Acre 2ª Edição

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