26 julho 2024

Responsabilidade legal em grupos de WhatsApp: Administradores podem ser responsabilizados por ofensas de membros

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A forma como as pessoas se comunicam mudou nos últimos tempos. Com a popularidade dos aplicativos de mensagens instantâneas, especialmente da plataforma digital “WhatsApp”, ficou cada vez mais fácil e rápido dialogar com outras pessoas, em qualquer parte do mundo, encurtando distâncias.

Entretanto, algumas situações incômodas em grupos criados no referido aplicativo vêm atingindo os seus administradores, levando os mesmos a responderem judicialmente por essas questões. Se antes você, administrador de um grupo, achava que somente os usuários ofensores que estavam envolvidos em brigas poderiam ser responsabilizados, pode começar a ficar preocupado e passe a redobrar a atenção em seus grupos.

A Justiça brasileira, em recentes decisões, passou a mirar os administradores de grupos do aplicativo por atos ilícitos que foram praticados por outros participantes, numa tentativa de educar os usuários da plataforma virtual.

Como exemplo, na Justiça do Estado de São Paulo, uma jovem foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais por não ter agido para interromper uma discussão havida entre membros de um grupo que ela criou e era administradora. De acordo com os autos do processo, o grupo tinha sido criado no ano de 2014 e reunia os amigos de escola, numa forma de combinar com os mesmos de assistir em sua casa a uma partida da seleção brasileira na Copa do Mundo daquele ano.

Todavia, algumas pessoas começaram a disparar ofensas contra outros participantes, e, em meio ao falatório, a jovem decidiu encerrar o grupo, mas acabou voltando atrás e novamente criou outro, tendo permanecido as provocações entre eles. Assim, em que pese a jovem não tivesse participado diretamente da briga em questão e não tivesse ofendido quem a processou, a mesma foi responsabilizada judicialmente por ser criadora e administradora do grupo na plataforma.

No primeiro grau de jurisdição, o requerimento indenizatório foi julgado improcedente, uma vez que a juíza responsável pelo caso, Andrea Schiavo, adotou a posição de que a jovem não teria postado qualquer mensagem ou deboche praticando bullying, não havendo, portanto, como ser penalizada por criar um grupo em aplicativo de mensagens instantâneas com a finalidade exclusiva de convidar um grupo de amigos para um evento em sua residência.

Ocorre que o relator do recurso que foi interposto perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Desembargador Soares Levada, muito embora tenha reconhecido que não foi demonstrado que a jovem efetivamente tivesse, ela própria, ofendido diretamente os integrantes do grupo, teria ficado evidenciado que em nenhum momento ela tentou minimizar os insultos havidas entre os participantes do grupo, inclusive tendo enviado emojide risada em resposta a determinada mensagem:

“ré que, na qualidade de criadora do grupo, no qual ocorreram as ofensas, poderia ter removido os autores das ofensas, mas não o fez, mostrando ainda ter se divertido com a situação por meio de emojis de sorrisos com os fatos”.

Segundo o Magistrado, seria “inegável” que no aplicativo “WhatsApp” o criador de um grupo, a princípio, não teria a função de moderador e nem poderia saber, com determinada antecedência, o que seria postado pelos demais usuários, porém, existia uma funcionalidade atribuída aos administradores do grupo que poderia ter sido aventada: de adicionar e de remover os seus membros a qualquer tempo.

“Ou seja, no caso dos autos, quando as ofensas, que são incontroversas, provadas via notarial, e são graves, começaram, a ré poderia simplesmente ter removido quem ofendia e/ou ter encerrado o grupo. Quando o encerrou, ao criar outro grupo o teor das conversas permaneceu o mesmo, como as transcrições juntadas aos autos, cuja autenticidade não é questionada, demonstram à saciedade”.

Para tanto, a Justiça do Estado de São Paulo entendeu por aplicar as disposições dos artigos 186 e 927 do Código Civil ao caso concreto, cujas redações seguem abaixo transcritas, condenando a administradora do grupo ao pagamento de indenização por danos morais em vista da briga entre os membros.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Importante destacar que essa postura vem sendo adotada por outros órgãos integrantes do Poder Judiciário, demonstrando a sua intenção de que os participantes dos grupos privados de mensagens de aplicativos passem a ter ciência daquilo que é exposto, e, ainda que não participem de uma ação, passem a mitigar os danos, considerando que as relações em mídias sociais devem ser fundamentadas na boa fé.

Provavelmente a responsabilização dos administradores de grupos das plataformas digitais deve permear as futuras decisões, virando uma tendência no Judiciário, tendo em vista que os tribunais brasileiros têm o costume de penalizar os internautas pelas interações havidas no mundo virtual como função pedagógica.

A partir disso, fica registrado um alerta aos administradores de grupos: na hipótese de acontecer uma briga entre os integrantes do aplicativo de mensagens, configurando uma ação ilícita, tome todas as atitudes necessárias a fim de encerrar a confusão ou minimizá-la, sob pena de ser responsabilizado judicialmente por quem se sentir ofendido.

 

Por Henrique Antonio de Lima
Advogado, sócio do escritório Danielle Cichocki & Advogados Associados e conciliador no Juizado Especial Cível de Pato Branco. Especialista em Direito Civil e Processual Civil e em Direito do Consumidor.

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